Descubra como a comissão de PAD pode comprometer a imparcialidade no processo e prejudicar a defesa dos servidores públicos.
O formato original de um processo administrativo disciplinar (PAD) é, por si só, problemático. Para entender isso, vamos comparar com o funcionamento do processo criminal, na justiça.
Na justiça, temos figuras distantes entre si. O Ministério Público faz a acusação, a Defensoria Pública ou um advogado privado faz a defesa, e o juiz, que é totalmente imparcial — e distante tanto do Ministério Público quanto da defesa —, analisa os fatos e provas e dá a decisão.
Desse modo, no processo criminal, a acusação tem a oportunidade de apresentar suas razões e provas, e a defesa tem a chance de se defender dessas acusações, também mostrando suas razões e provas. E, a partir desse procedimento, o juiz toma uma decisão baseada nos elementos de prova.
Mas no PAD, a situação é diferente.
Segundo o artigo 150 da Lei 8.112, que é o o estatuto dos servidores públicos federais (e que também tem previsão em vários outros estatutos estaduais e municipais), a comissão de PAD deve ser imparcial. Ou seja, isenta.
Isso significa que nenhum membro da comissão pode ter interesse no procedimento disciplinar, seja para absolver, seja para prejudicar o servidor público investigado, por razões pessoais.
Contudo, na prática, o cenário mais comum é o seguinte: quando há inimizade entre o servidor investigado e alguém dentro do órgão, geralmente uma chefia, essa pessoa, que tem algum tipo de poder interno, consegue indicar pessoas de sua confiança para conduzir o PAD.
E isso prejudica muito a imparcialidade da comissão.
A comissão do PAD e a imparcialidade
Essa questão exposta acima compromete a imparcialidade. Isso porque nesses casos a comissão já recebeu instruções para punir de toda forma o servidor investigado, independentemente da qualidade de sua defesa ou das provas apresentadas.
Essa dinâmica leva a um cenário no qual mesmo com uma defesa robusta e provas contundentes, as chances de resolução justa no âmbito do PAD são mínimas, aumentando a probabilidade de que o caso só se resolva na justiça.
A comissão é formada por três servidores e realiza a investigação e a acusação. O que, sem dúvida, dificulta a isenção na hora de investigar, buscar informações e, consequentemente, tomar uma decisão. Tudo isso torna a estrutura do PAD problemática.
Seria como se o Ministério Público na justiça fizesse a acusação, a investigação e também julgasse. Embora tecnicamente não seja a comissão de PAD que julga, geralmente, na prática, a autoridade competente apenas assina o que a comissão já decidiu, incluindo o relatório final e a recomendação de punição.
A maioria dos processos administrativos disciplinares termina com a autoridade competente concordando com a comissão de PAD, e raramente divergindo de suas conclusões. Isso ocorre porque a comissão realiza todo o trabalho de apuração e investigação, ouve as testemunhas e produz o relatório final com a sugestão da pena — de acordo com as informações a respeito do processo.
Logo, fica evidente que é necessário haver um distanciamento entre a figura do acusador, a do investigador, e a do julgador. Pois, uma comissão parcial, não isenta, isto é, que toma parte, pode prejudicar — e muito — o servidor em investigação, ainda que ele tenha as melhores provas e uma ótima defesa.
Então, o que fazer?
Se você está passando por um PAD e algum dos membros da comissão, ou todos, tem interesse em te prejudicar, você precisa alegar a suspeição de tais membros. Mas não basta apenas alegar, é necessário comprovar que eles são suspeitos, ou seja, que têm interesse pessoal na punição do servidor.
Por exemplo, se você tem uma desavença com sua chefia e sabe que os membros da comissão são amigos próximos dela, é preciso comprovar essa amizade. Porém, não só isso, é preciso também comprovar a sua desavença com a chefia.
Se você só comprovar a amizade da comissão com a chefia, mas não a desavença, a comissão em tese não é suspeita.
Isso quer dizer que não há problema nenhum na comissão ser amiga do seu chefe, por exemplo. Agora, a partir do momento que você tem problemas de relacionamento com o seu chefe e ele é próximo de um ou mais membros da comissão, presume-se, nesse caso, uma suspeição e até mesmo uma ingerência.
Quando as pessoas são do mesmo órgão, mesmo que um membro da comissão não queira se sujeitar a ingerências, tomar parte, ele pode ter medo das consequências. Já ouvi de membros de comissão que, se eles não fizessem o que estava determinado por alguns — a tal politicagem —, poderiam ser as próximas vítimas.
Portanto, é necessário uma carreira específica e imparcial de membros de comissão de PAD formada por juristas e por pessoas que não atuam naquele órgão.
Quando os membros da comissão têm vínculos de amizade ou sofrem ingerência, a chance de defesa do servidor investigado é quase zero. Desse modo, ele precisa alegar a suspeição dos membros para ter alguma chance de se defender.
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Como comprovar a suspeição?
Você pode comprovar essa suspeição reunindo elementos que comprovem a proximidade ou o interesse dos membros da comissão com relação ao caso. Isso pode ser feito juntando prints de mensagens de WhatsApp e de interações em redes sociais.
Por exemplo, se um dos membros da comissão for muito amigo do chefe com quem você tem desavenças, busque provas dessas interações, como comentários em postagens no Instagram ou no Facebook que indiquem essa proximidade.
O artigo 150 da Lei 8.112 exige que os membros da comissão trabalhem com imparcialidade e isenção, julgando apenas fatos e provas, sem qualquer sentimento pessoal que possa influenciar sua análise.
E, se você fez um requerimento alegando suspeição, anexando todas essas provas, mas a comissão não foi substituída, você pode e deve impetrar um mandado de segurança para exigir a substituição imediata desses membros suspeitos, sob pena de suspensão do PAD.
Geralmente, quando a suspeição é bem comprovada, o juiz concede uma liminar suspendendo o processo administrativo disciplinar até que os membros sejam substituídos. Nessa situação, o juiz realiza um controle de legalidade, assegurando que a comissão do PAD atue conforme a lei, mantendo a isenção necessária para um julgamento justo.
Além disso, eventualmente, se você passou por um processo administrativo disciplinar, alegou suspeição, mas isso não foi cumprido, ou ainda que não tenha alegado, mas no futuro você descobriu que aquela comissão não era imparcial, ou seja, estava orientada para te punir, da mesma forma, ainda que você já tenha sofrido a punição, é possível ingressar no judiciário para pedir a nulidade daquela pena.
Isso porque o processo tramitou com uma comissão parcial, isto é, contrária ao que está disposto na lei. E por causa dessa parcialidade, dessa ingerência, você foi punido. Então essa pena é ilegal.
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