Fruto do “novo normal” que surgiu com a pandemia de Covid-19, o teletrabalho se consolidou como ferramenta essencial na gestão de pessoas, especialmente no setor público.

Ele impacta diretamente a saúde funcional dos servidores. Com o regime emergencial, ficou claro que muitas funções no serviço público podem ser desempenhadas com igual ou até maior eficiência a partir da residência do servidor.
Assim, quando se comprovou que o teletrabalho não prejudicou a produtividade, ele também se mostrou uma solução viável para servidores com problemas de saúde que precisam de condições especiais para continuar trabalhando.
No entanto, mesmo com laudo médico robusto, muitos servidores tiveram o teletrabalho negado. Em vários casos, essa negativa ocorre sem uma razão clara. Por isso, é fundamental entender a importância do teletrabalho para esses servidores e saber como reagir quando o pedido de teletrabalho é negado, mesmo com comprovação médica.
O teletrabalho como instrumento de saúde funcional
Antes de tudo, é importante destacar que o regime de teletrabalho, quando motivado por razões de saúde, deve ser visto como medida de proteção ao servidor, e não como privilégio. A Constituição Federal garante o direito à saúde e à dignidade da pessoa humana. Esses princípios devem orientar a interpretação e a aplicação das normas administrativas.
Com a implementação do teletrabalho, diversos benefícios foram observados entre os servidores transferidos para o trabalho em casa. Esses resultados ajudaram a consolidar o teletrabalho como ferramenta fundamental para a saúde funcional do servidor. Entre os principais efeitos positivos, podemos citar a melhora da saúde mental, a redução do estresse, o maior controle da rotina, a melhoria do ambiente de trabalho, a prevenção de doenças ocupacionais e a inclusão de pessoas com deficiência (PcD) e com mobilidade reduzida.
Diante de tantos pontos positivos, obrigar o servidor a retornar ao trabalho presencial, mesmo sabendo que essa forma de trabalho prejudica a sua saúde, gera sérios riscos. A decisão afeta a vida profissional e pessoal do servidor e, ao mesmo tempo, prejudica a própria Administração Pública, já que o servidor não estará em condições ideais para desempenhar suas funções com eficácia.
Dessa forma, além de instrumento de proteção à saúde, o teletrabalho também contribui para garantir um dos metaprincípios da Administração Pública, previsto no artigo 37 da Constituição Federal: o princípio da eficiência. Assim, em muitos casos, quando o pedido é de saúde, o teletrabalho negado vai na contramão desse princípio.
Por que a Administração pode negar?
Após o fim do regime emergencial da pandemia de Covid-19, muitos órgãos públicos editaram normas internas para regulamentar o teletrabalho. Em geral, esses normativos determinaram o retorno presencial de grande parte dos servidores. A partir desse momento, quem desejava voltar ao regime remoto precisava formular um pedido formal ao setor responsável.
No entanto, em vez de estabelecer critérios objetivos e transparentes, a maioria desses regulamentos deixou a decisão final nas mãos do gestor imediato do servidor. Com isso, uma política que deveria proteger a saúde passou a ser tratada como concessão excepcional, sujeita à discricionariedade administrativa.
Em consequência, muitos servidores, mesmo com laudo médico, tiveram o teletrabalho negado com base em critérios subjetivos e pouco claros. Por vezes, a Administração sequer informou de forma adequada ao servidor quais foram os fundamentos da negativa.
Em alguns casos específicos, é verdade que a Administração pode negar o teletrabalho. Isso ocorre, por exemplo, quando a natureza da atividade exige a presença física do servidor na unidade em que ele está lotado.
Nesses casos, a Administração exige a presença física do servidor. Isso vale para quem realiza atendimento presencial ao público, executa atividades externas ou de campo ou precisa acessar equipamentos e sistemas que, por questões de sigilo, logística ou segurança, ficam disponíveis apenas nas dependências do órgão público.
Além disso, muitos regulamentos internos vedam o teletrabalho a servidores em estágio probatório e àqueles que exercem funções de liderança ou chefia. Nesses casos, a restrição costuma estar expressa em norma interna.
Apesar disso, em todos os cenários, a negativa precisa ser razoável e devidamente fundamentada. A Administração deve basear sua decisão em critérios objetivos, que permitam ao servidor compreender os motivos do teletrabalho negado e, se for o caso, apresentar recurso quando considerar a decisão injusta ou ilegal.
Como fortalecer o pedido de teletrabalho?
Para fortalecer o pedido de teletrabalho, especialmente quando baseado em situação de saúde, o servidor precisa reunir a documentação adequada. Assim, é essencial apresentar, já com o requerimento administrativo, todos os documentos que comprovem a necessidade do regime remoto. Entre eles, estão laudos médicos, exames e relatórios que demonstrem como o teletrabalho protege a saúde laboral e preserva a eficácia do serviço público.
Além disso, em muitos órgãos, alguns servidores têm preferência na seleção para o teletrabalho. Essa prioridade aumenta a chance de aprovação do pedido. Em geral, possuem preferência servidores com deficiência (PcD), servidores com dependente legal PcD, servidores com mobilidade reduzida, servidores que acompanham cônjuge ou companheiro deslocado no interesse da Administração e servidores idosos.

Portanto, sempre que possível, é importante destacar essas situações no pedido. Isso ajuda a evitar que o teletrabalho seja negado sem análise adequada do contexto pessoal e funcional do servidor.
Por fim, contar com a ajuda de advogado especializado em Direito Administrativo pode fazer grande diferença. Um profissional da área sabe estruturar o pedido, escolher os argumentos mais fortes e indicar a legislação e a jurisprudência aplicáveis. Dessa forma, o servidor reduz o risco de ter o teletrabalho negado por falhas de fundamentação no próprio requerimento.
Leia mais em: Por que tantos servidores têm o teletrabalho negado mesmo com laudo médico?
Quando levar o caso à Justiça?
Como já mencionado, o teletrabalho motivado por razões de saúde deve ser visto como medida de proteção ao servidor público. Por isso, quando a Administração apresenta uma negativa sem fundamento, a situação pode configurar violação do direito à saúde.
Nesses casos, o primeiro passo é questionar a decisão dentro do próprio órgão, por meio de recurso administrativo. Esse recurso permite pedir que a autoridade revise o indeferimento e reavalie a situação à luz dos documentos médicos apresentados.
No entanto, mesmo o recurso administrativo pode ser negado sem justificativa sólida. Quando isso acontece, ou quando há urgência e risco de dano irreparável à saúde do servidor, o caminho seguinte é a via judicial.
Nesse momento, é indispensável a representação por advogado. Um advogado especializado em Direito Administrativo fortalece de forma decisiva as chances de reverter o teletrabalho negado. Com uma atuação técnica adequada, é possível demonstrar a ilegalidade ou a falta de razoabilidade da negativa e buscar, perante o Judiciário, o reconhecimento do direito ao teletrabalho por motivo de saúde.

