Pregoeiro pode ser responsabilizado e multado por falha na elaboração de edital?

Por Luciana Lara Sena Lima e Sérgio Merola

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O pregoeiro é o responsável por conduzir a fase externa do pregão, modalidade de licitação que simplificou os processos licitatórios no Brasil.

O pregão é o processo de compras de bens e serviços comuns da Administração Pública.

São compras de qualquer valor, desde que sem grande complexidade e de fácil reconhecimento no mercado.

Mas, isso não quer dizer que o processo de compras pela modalidade pregão não seja complexo para a Administração Pública.

O pregoeiro, além da qualificação técnica e jurídica para lidar com as exigências legais do processo licitatório, arca com a responsabilidade de conduzir processos de compra e aquisição de serviços.

Além disso, a sua atividade está sujeita a fiscalização e controle, podendo ser responsabilizado em caso de fraude ou erros na condução do processo licitatório.

Infelizmente, em muitos casos, o pregoeiro não recebe, da administração pública, a devida formação técnica para o exercício de sua função.

Isso ocorre muito em pequenos órgãos e prefeituras, que acabam terceirizando, para empresas especializadas em licitação ou advogados, muitas das incumbências das comissões de licitação e do pregoeiro.

É uma terceirização problemática, pois a responsabilidade pela legalidade do pregão acaba recaindo no gestor público e no pregoeiro.

Estudo de caso – posicionamento do Tribunal de Contas do Estado do Paraná

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Apesar do peso da responsabilidade das atribuições do pregoeiro, o Tribunal de Contas do Estado do Paraná, num caso bem recente, reconheceu que o pregoeiro, bem como os integrantes da sua equipe de apoio, não podem ser responsabilizados pelas falhas do edital.

Confira a decisão do TCE/PR, na página 15, do Diário Eletrônico do TCE/PR – Acórdão 1611/2019.

Inicialmente, o TCE/PR havia aplicado multa aos servidores responsáveis pelo pregão eletrônico, devido a irregularidades constatadas no instrumento convocatório.

Os agentes recorreram da decisão junto ao próprio TCE/PR e obtiveram êxito: a decisão foi reformada.

Foi reconhecida a ilegitimidade passiva dos integrantes da equipe de apoio e do pregoeiro, sendo afastadas as multas.

Para os Conselheiros que julgaram o recurso, a mera designação do pregoeiro e equipe de apoio não transfere ou delega os poderes e responsabilidades da Autoridade Competente, que no referido caso é a responsável pelas cláusulas no edital, conforme previsão da Lei 10.520/2002 (art. 3º, I).

Foram aplicadas 2 multas, devido a não observância das formalidades legais do procedimento licitatório.

Um dos itens do edital trazia a exigência de balanço patrimonial das empresas participantes, sem contudo indicar o índice para o cálculo.

A outra exigência considerada irregular foi a de obrigatoriedade de apresentação de capital social integralizado, equivalente a 10% do valor da contratação, na data da apresentação da proposta.

Contudo, no recurso, os conselheiros entenderam que a designação do pregoeiro e da equipe de apoio não pode ser compreendida como delegação de poderes da autoridade competente, no caso, o Secretário de Estado de Administração e Previdência do Estado do Paraná.

Este, sim, é o responsável pela elaboração do edital, e quem deveria ter sido acionado pelas irregularidades.

A Lei do Pregão (Lei 10.520/2002) é bem clara com relação a este ponto:

Art. 3º, I – a autoridade competente justificará a necessidade de contratação e definirá o objeto do certame, as exigências de habilitação, os critérios de aceitação das propostas, as sanções por inadimplemento e as cláusulas do contrato, inclusive com fixação dos prazos para fornecimento; 

Não há delegação alguma, apenas designação do pregoeiro e equipe, responsáveis pela chamada “fase externa” do pregão.

As multas, inicialmente aplicadas, estão previstas na Lei Orgânica do Tribunal de Contas do Estado do Paraná.

É uma Lei Complementar Estadual (LC 113/2005), que determina o seguinte: 

Art. 87. As multas administrativas serão devidas independentemente de apuração de dano ao erário e de sanções institucionais, em razão da presunção de lesividade à ordem legal, fixadas em valor certo, em razão dos seguintes fatos: 

III – No valor de R$ 500,00 (quinhentos reais): 

d) deixar de observar, no processo licitatório, formalidade determinada em lei, incluindo-se a não exigência de certidões negativas e de regularidade fiscal, podendo ser aplicada ao presidente da comissão de licitação, ao emitente do parecer técnico ou jurídico e ao gestor;

Perceba que pregoeiro não é presidente, nem membro de comissão de licitação.

A responsabilidade pela não observância de formalidade legal no edital, conforme a Lei paranaense, deve recair no presidente da comissão de licitação, no gestor e até ao técnico que emite parecer.

Importante: essa lei se aplica aos processos licitatórios na esfera estadual, no Paraná. Em outros Estados, temos outras leis e regulamentos determinando a responsabilidade dos agentes públicos participantes de processos licitatórios.

Apesar da decisão discutida acima se basear em decisão do Tribunal de Contas do Estado do Paraná, regra geral, a responsabilidade pela a elaboração do edital e a sua regularidade jurídica é da autoridade competente do órgão licitante.

Aliás, o próprio Tribunal de Contas da União (TCU) tem o posicionamento de não responsabilizar o pregoeiro por irregularidade em edital, já que a sua elaboração não se insere entre as suas competências legais.

Confira aqui a decisão do TCU sobre a responsabilidade dos pregoeiros diante de irregularidades do edital (Acórdão 1729/2015 – 1ª Câmara).

Isso significa que o pregoeiro nunca será responsabilizado por irregularidades?

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Existem casos em que o pregoeiro será, sim, responsabilizado e multado.

Na fase externa do pregão, deverão ser elaborados termos de referência, o ato convocatório, bem como executadas pesquisas de mercado e atos preparatórios, que são de responsabilidade do pregoeiro e da sua equipe de apoio.

Nestes casos, eles poderão responder por falhas e irregularidades no pregão, sendo multados.

Em casos mais extremos, poderão ser responsabilizados, respondendo a Processos Administrativos Disciplinares (PAD), a ação de improbidade administrativa e até ações criminais.

Para o TCU, o pregoeiro tem a obrigação de recusar-se a cumprir o edital, quando este trouxer cláusulas sabidamente em desacordo com as leis e princípios de licitação (confira decisão).

Devem, ainda, reportar tais irregularidades às autoridades competentes, para que tomem as devidas providências.

Se assim não o fizerem, poderão ser responsabilizados.

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