A incontinência pública no serviço público pode levar à demissão por PAD. Entenda como se defender e garantir seus direitos.
Durante o exercício de suas funções, o servidor público pode ser surpreendido com a instauração de um processo administrativo disciplinar PAD, para averiguar a possível prática de uma conduta ilícita no âmbito do serviço público.
Dentre as diversas condutas que podem ensejar a instauração de um PAD, inclui-se a prática da incontinência pública. Neste artigo, você entenderá melhor o que essa prática significa e como proceder ao ser acusado em um processo administrativo disciplinar.
O que é Incontinência Pública?
Definição de incontinência pública
A incontinência pública é entendida como a prática habitual de condutas escandalosas, vulgares ou depravadas, bem como aquelas que possam trazer graves perturbações a ordem no serviço.
A lei 8.119/90, que trata do regime jurídico dos servidores públicos federais, insere, em seu artigo 132, a incontinência pública como uma das hipóteses de demissão do servidor público.
Como entender a acusação de incontinência pública
Inicialmente, para a caracterização da incontinência pública, é necessário que as condutas tenham sido praticadas pelo servidor público dentro da repartição. Logo, o comportamento depravado do servidor em sua vida privada não é causa de demissão, a não ser que, mesmo tendo sido praticada fora da repartição, a conduta esteja relacionada ao exercício das atribuições do servidor.
Assim, a prática de condutas que ofendam gravemente a moral, ainda que praticadas às escondidas, serão consideradas escandalosas e podem ocasionar a demissão do servidor.
Da mesma forma, certas condutas que possam gerar grave perturbação à ordem dentro da repartição ou que causem tumultos injustificados também podem configurar incontinência pública.
Considerando ser a moralidade um dos princípios basilares da atividade pública, em obediência ao comando constitucional expressamente previsto no art. 37, caput, da Constituição Federal, os atos que ofendam a moralidade – não somente a “moralidade administrativa”, entendida como probidade, honestidade e boa-fé, mas também a “moralidade comum”, qual seja, o conjunto de regras morais e éticas que regem a sociedade como a conhecemos – serão prontamente coibidos e punidos pela Administração Pública.
Exemplos de incontinência pública no serviço público
Para melhor elucidação do tema, trazemos alguns exemplos de condutas que podem configurar a incontinência pública: o uso de drogas dentro do ambiente de trabalho, o compartilhamento assíduo de conteúdos pornográficos entre servidores, bem como o próprio consumo de conteúdo desta natureza e demais atos de conotação sexual e libidinosos dentro da repartição, o assédio moral ou sexual cometido contra outros servidores dentro do ambiente de trabalho.
Além destes exemplos, outras muitas condutas poderão configurar a prática da incontinência pública. Em 2023, por exemplo, o STJ considerou que a conduta de filmar alunas, servidoras e funcionárias terceirizadas utilizando-se de uma câmera escondida, configurava uma conduta escandalosa, caracterizando a incontinência prevista no art. 132, V, da Lei 8.112/90
Como o Processo Administrativo Disciplinar (PAD) Funciona em Casos de Incontinência Pública
Principais etapas do PAD que você deve conhecer
A acusação de incontinência pública poderá levar a demissão do servidor público. Para tanto, é obrigatória a instauração de um processo administrativo disciplinar (PAD), a fim de averiguar e comprovar a prática da conduta pelo servidor público, bem como se esta é capaz de gerar a sua demissão.
O PAD é constituído de três fases. A primeira é a instauração do inquérito administrativo. Nesse momento, será designada uma comissão processante para conduzir o procedimento. Será apresentada uma descrição sumária dos fatos, indicando a conduta praticada e a infração cometida. O PAD somente pode ser instaurado se for devidamente motivado, com amparo em investigação prévia ou sindicância, conforme dispõe a Súmula 611, do STJ.
A segunda fase é o inquérito administrativo, que se inicial com a instrução processual. Essa fase é de suma importância, pois é nela que serão colhidas todas as provas necessárias para demonstrar ou não a prática da conduta irregular pelo servidor.
Todos os meios de provas são admitidos durante a instrução, inclusive provas testemunhais. O acusado deverá ser intimado para produzir todas as provas de defesa que achar necessário. Ao servidor processado, é garantida a ampla defesa e o contraditório, bem como a possibilidade de constituir um advogado para a sua defesa.
Após a conclusão da instrução, será elaborado um relatório conclusivo pela comissão processante, no qual deverá ser emitida uma opinião acerca da decisão que deverá ser tomada pela autoridade competente.
O relatório será enviado para a autoridade competente para que esta proceda a terceira fase do PAD que é o julgamento. A penalidade de demissão poderá apenas ser proferida por autoridades de alto escalão dentro do serviço público, o que varia de acordo com o órgão público. No caso de um servidor vinculado ao Poder Executivo de um dos estados, tal punição poderá ser aplicada apenas pelo Governador do referido estado.
Após o julgamento, o servidor poderá recorrer da decisão. Devemos ressaltar que o servidor não pode ser compelido a realizar qualquer depósito prévio para recorrer das decisões administrativas, de acordo com a Súmula Vinculante 21, do STF.
Tempo estimado para a resolução do PAD
Em regra, o prazo do PAD é de 140 dias. O prazo é dividido em duas partes: a primeira, entre a insaturação do processo e a elaboração do relatório, é de 60 dias, podendo ser prorrogado por mais 60 dias; já a segunda, após a elaboração do relatório até o julgamento, é de 20 dias.
Para mais informações, confira o artigo “Como funciona o processo administrativo disciplinar“.
Direitos do Servidor Durante o Processo
O que você pode e deve fazer durante o PAD por Incontinência Pública
No curso de um PAD, o servidor em garantia a direitos essenciais, que asseguram a sua defesa e a imparcialidade do processo.
A ampla defesa e o contraditório é um dos principais direitos assegurados ao servidor. Por ele, o servidor tem a garantia de que poderá produzir todas as provas que forem necessárias para demonstrar sua inocência, bem como de que nenhuma decisão será proferida sem que ele tenha sido ouvido previamente.
Além da amplitude da defesa, é garantido ao servidor a possibilidade da contratação de um advogado para exercer todos os seus direitos de defesa. Após a instauração do processo, o servidor será intimado para apresentar a defesa e, por meio de um advogado especializado, terá condições de defender-se da forma mais adequada possível das acusações.
Ainda com relação a defesa, outra garantia importante assegurada ao servidor é a presunção de sua inocência. Enquanto não houver a decisão definitiva, presume-se que o servidor não praticou infração alguma. Logo, não poderão ser presumidas verdadeiras as acusações feitas ao servidor, mesmo que ele não se defenda no momento em que for intimado, tornando-se revel. Assim, qualquer penalidade somente poderá ser aplicada ao servidor público se a suposta conduta ilícita for devidamente comprovada.
Por fim, o servidor tem direito à imparcialidade daqueles que conduzem o processo. Assim, aplicam-se causas de impedimento e suspeição aos servidores que constituem a comissão processante, de forma que não poderão fazer parte dela pessoas que tenham algum interesse pessoal no processo ou que possuam relação de amizade ou inimizade com o servidor.
Como a defesa pode ajudar em seu caso
Diante da complexidade do processo administrativo disciplinar e da própria compreensão acerca das condutas que podem ou não configurar penalidades, bem como quais sanções podem ser aplicadas, é fundamental ao servidor público que está sofrendo um PAD a contratação de um advogado especializado.
A contratação do profissional garantirá orientações importantes acerca do procedimento e das regras do PAD. Além disso, é papel do advogado especializado buscar garantir que todas as fases do processo sejam conduzidas de acordo com a lei. Evidentemente, a defesa técnica permitirá ainda o cumprimento pleno do direito de defesa do servidor, evitando punições injustas e erros processuais.
Para mais informações, consulte o artigo “Direitos do Servidor Público Durante o PAD“.
Consequências Possíveis em Casos de Incontinência Pública
Tipos de penalidades que podem ocorrer
Em casos extremos, como visto, a prática da incontinência pública poderá acarretar a demissão do servidor público. Porém, essa não é a única penalidade que poderá ser aplicada ao servidor.
Em casos mais comuns e de menor gravidade, o servidor poderá ser advertido e, em caso de reincidência da advertência, poderá ser suspenso. Tanto a advertência quanto a suspensão, desde que não seja superior a 30 dias, serão aplicadas pelo próprio chefe da repartição na qual o servidor está lotado.
Porém, em certos casos, a suspensão poderá exceder o prazo de 30 dias, hipótese em que será aplicada pela autoridade imediatamente inferior àquela que aplica a demissão. Em todos os casos, a suspensão do servidor não poderá ser superior a 90 dias.
Como as penalidades podem afetar a sua carreira
As penalidades aplicadas aos servidores públicos serão registradas em seu cadastro e, somente poderão ser canceladas caso o servidor não cometa nova transgressão disciplinar. No caso da advertência, a infração ficará registrada por 3 anos. Já a suspensão, constará no cadastro pelo período de 5 anos.
Diante disso, as penalidades poderão afetar a sua carreira de servidor público, especialmente durante o período em que elas ficam registradas em seu cadastro. O registro de penalidades poderá impedir a promoção para cargo superior e também pode acarretar a negativa de um eventual pedido de transferência.
A prática de infrações administrativas ainda poderá prejudicar o servidor que já está aposentado. Caso o servidor aposentado tenha praticado alguma infração administrativa durante a atividade pública, poderá ter a sua aposentadoria cassada. Diante disso, é importante relembrar que a aplicação desta penalidade prescreve em 5 anos, contados da data em que o fato foi praticado. Logo, em regra, passados 5 anos da prática da infração, o servidor aposentado não poderá mais ter a sua aposentadoria cassada.
Como Provar a sua Defesa em um PAD por Incontinência Pública
Provas que podem ajudar em sua defesa
A defesa dentro de um PAD poderá ser feita de forma ampla, admitindo toda e qualquer prova lícita. Assim, poderão ser juntados todos os documentos que possam ajudar na defesa do servidor, incluindo registros de trabalhos, atestados, certidões.
Além disso, a prova testemunhal, especialmente diante da acusação de incontinência pública, é de grande importância. Os relatos de colegas de trabalhos que possam demonstrar a moralidade e bom comportamento do servidor poderão ser fundamentais para provar a inocência do servidor ou, ao menos, para abrandar a sua penalidade.
Estratégias comuns de defesa
Aqui, novamente relembramos a importância de um advogado especializado em PAD para auxiliar na sua defesa em um processo administrativo disciplinar.
Por sua atuação em diversos casos, o advogado possui amplo conhecimento prático e poderá se utilizar de julgados de casos similares ao seu para requerer que a autoridade julgadora siga aquela mesma posição.
Além do uso de jurisprudências administrativas favoráveis, um advogado especializado também estará sempre atento a pensar em todas as possíveis decisões que a autoridade julgadora poderá tomar. Diante disso, é fundamental não somente pedir a absolvição do servidor, que já é uma grande vitória, mas também, de forma subsidiária, pedir a aplicação de uma penalidade mais branda, como uma suspensão ou até mesmo uma simples advertência.
Consulte o artigo “Defesa em Processo Administrativo Disciplinar“.
Possibilidades de Anulação do PAD
Em quais casos o PAD pode ser anulado
Diversos erros processuais e violações a direitos garantidos ao servidor processado poderão acarretar a nulidade do PAD.
É muito comum o excesso do prazo de duração do processo administrativo disciplinar. Neste caso, se houver um comprovado prejuízo ao servidor processado, o PAD poderá ser declarado nulo, conforme prevê a Súmula 592, do STJ.
Além disso, decisões imotivadas e sem fundamentos em provas idôneas poderão também levar a nulidade do processo administrativo, haja vista a necessidade de que a aplicação de penalidades seja fundamentada em evidências claras e irrefutáveis de que o servidor praticou uma infração administrativa.
A falta de notificação do servidor para que apresente a defesa também é causa de nulidade, uma vez que afronta diretamente os princípios do contraditório e da ampla defesa. Outra circunstância que pode ensejar uma ofensa a esses princípios é a negativa indevida da produção de determinada prova capaz de demonstrar a inocência do servidor, configurando um cerceamento de defesa.
Ainda com relação às provas, é importante que todas as provas que irão basear a decisão da autoridade julgadora tenham sido obtidas de forma lícita. Assim, as provas obtidas de forma ilícita, violando a lei e direitos do servidor público, não podem ser utilizadas para a formação da convicção da autoridade julgadora, devendo ser retiradas do processo.
Por fim, a desproporcionalidade da penalidade também poderá acarretar a nulidade do PAD. Relembremos que a legalidade é um dos cinco princípios expressos no artigo 37 da Constituição Federal que norteiam a atividade administrativa. Assim, a aplicação de penalidades em desconformidade com a lei é causa de nulidade do PAD, por violar tão importante comando constitucional.
Além disso, a Súmula 655 do Superior Tribunal de Justiça (STJ) dispõe que o controle jurisdicional do PAD se limita ao exame da regularidade do procedimento e da legalidade do ato. Assim, embora o mérito da decisão administrativa geralmente não seja revisado, a justiça pode intervir quando a punição é claramente desproporcional.
O que fazer caso o processo tenha erros
Diante de algumas dessas situação, é de fundamental importância recorrer a um advogado especializado na defesa de servidores públicos que estão sofrendo um PAD. Com auxílio de um advogado, você poderá contestar os erros cometidos durante o PAD e pedir a sua anulação.
Veja mais no artigo O que pode anular um PAD?.
Como se preparar para o que está por vir
Ser processado por meio de um PAD certamente é uma das situações mais difíceis enfrentadas por um servidor público. Por isso, recorrer a ajuda de profissionais especializados na área é fundamental, não somente para garantir que todos os seus direitos sejam respeitados, como também para trazer um pouco de tranquilidade ao servidor público.
Sabemos que um PAD pode nos abalar emocionalmente, afetando nosso trabalho e nossos relacionamentos sociais e familiares. Assim, é importante manter a calma e contar com a ajuda de profissionais experientes no assunto. Eles irão te tranquilizar e permitirão que você possa manter-se focado naquilo que mais importante, mesmo diante dessa situação.
Nesse momento, é muito importante ter a tranquilidade de saber que seus direitos serão garantidos por um profissional qualificado. Por isso, recomendamos sempre que consulte um advogado nestes casos e em qualquer hipótese relativa a um PAD.